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As Redes de Mídia de Varejo alçam voo na publicidade

Com o amadurecimento do comércio eletrônico e o predomínio de grandes players, o mercado de publicidade digital — particularmente os Retail Media Networks (RMNs) — tornou-se uma arena estratégica. Vamos abordar os principais pontos desse novo cenário, com análise dos desafios, oportunidades e possíveis caminhos para varejistas que queiram apostar forte nesse modelo, incluindo implicações para o mercado brasileiro.


Principais conceitos

  • RMNs (Retail Media Networks): redes de publicidade mantidas por varejistas, que oferecem espaço publicitário em seus sites ou apps — e também em lojas físicas, apps de parceiros, mídia digital, etc. O diferencial é que o varejista possui dados de primeira mão (first party) dos clientes, especialmente por meio de programas de fidelidade;
  • ROPO (Research Online, Purchase Offline): comportamento do consumidor de pesquisar online e comprar offline, ou misturar online e loja física. Esse padrão reforça a importância de que os varejistas utilizem múltiplos pontos de contato; os RMNs são uma forma de capturar valor nesse percurso.

Panorama global

  • Estimativas apontam que o mercado global de retail media vai atingir cerca de US$ 179,5 bilhões até o fim de 2025;
  • A Amazon domina atualmente esse mercado: em 2024, teve receita de cerca de US$ 60 bilhões somente com retail media. Em contraste, o Walmart lucrou aproximadamente US$ 4 bilhões com isso. Essas diferenças destacam tanto o espaço para crescimento de outros varejistas quanto a enorme vantagem que a Amazon já possui em escala;
  • Muitas empresas varejistas estão criando suas RMNs — mais de 200 lançamentos recentes — para capturar lucros de margens maiores do que aquelas típicas da venda de produtos/ímpeto varejista. Nos anúncios, as margens podem ultrapassar 70%.

Para que os varejistas consigam concorrer no mesmo patamar das grandes plataformas varejistas digitais é preciso ter os seguintes pilares:

1- Estrutura organizacional apropriada: Times dedicados à mídia e ao varejo precisam trabalhar alinhados. É diferente vender produtos e vender espaço publicitário. Uma postura de “vendedor de mídia” é exigida;

2- Dados de primeira parte (first-party data) de qualidade: fidelização, registro de comportamento de compra, histórico de navegação, preferências. Quanto melhor for a segmentação, mais valiosa será a RMN;

3- Variedade de formatos de anúncios: digital (site, app, display, listagens patrocinadas) + formatos físicos (telões em loja, displays instore) + parcerias externas (streaming, CTV, redes sociais) para cobrir todo o funil — conscientização, consideração, conversão;

4- Ferramentas de mensuração robustas: ROAS, iROAS, lift de vendas, impacto na marca. Uso de machine learning, testes A/B, métricas padronizadas;

5- Modelo de negócio bem definido: modos de operação como self-service para anunciantes, serviços gerenciados (quando necessário), alianças estratégicas para expandir alcance (ex: merchandising, mídia externa, parcerias de conteúdo).

Para competir de igual para igual com os grandes players é preciso:

  • Mentalidade de varejista vs. de mídia: muitos varejistas ainda operam com foco em estoque, logística e margem de produto. Para operar RMNs, é preciso pensar como plataforma de mídia, com orçamentos de anúncios, planejamento, métricas de performance específicas;
  • Qualidade de dados: dados incompletos, falhas em fidelização, problemas de privacidade, dificuldade em unir dados online e offline. Sem boa qualidade, segmentações e previsões perdem valor;
  • Ferramentas e formatos limitados: sem formatos diversificados ou opções self-service, os anunciantes (marcas) podem preferir ir para plataformas maiores que já oferecem recursos consolidados;
  • Medição consistente e transparente: demonstrar ROI é crucial. Se o varejista não consegue provar que seus anúncios geram retorno ou lift de vendas, marcas vão relutar em destinar orçamento;
  • Concorrência intensa: não só Amazon, mas Google, Meta e outras redes grandes, além de novos varejistas entrando nesse espaço. Só alguns vão conseguir converter RMNs em receita estável ou grande escala.

Estratégias para competir

Selecionamos 6 fatores para concorrer nesse mercado:

1- Investir em dados de cliente: programas de fidelidade, CRM, integração de dados online/offline. No Brasil, isso pode significar fortalecer iniciativas de fidelização nas lojas físicas, usar cartões de cliente, apps de varejo, etc;

2- Criar alianças ou parcerias: para ampliar alcance ou para oferecer formatos que não dominam internamente (por exemplo, mídia exterior digital, streaming local, mídias CTV, ou parcerias com plataformas sociais);

3- Desenvolver capacidades de agência interna: oferecer às marcas não só espaço de anúncio, mas consultoria, planejamento e insights. O varejista pode se tornar um parceiro estratégico, não apenas fornecedor de inventário;

4- Focar no omnicanal: combinar loja física, digital, mobile, app. Isso permite capturar diferentes momentos da jornada do cliente e fornecer métricas mais completas;

5- Transparência e mensuração: adotar métricas que marcas confiam, disponibilizar dados e relatórios claros, realizar experimentos para provar impacto;

6- Inovação em formatos físicos: usar locais de alta visibilidade dentro das lojas (como quiosques digitais, telas, pontos de venda) para publicidade instore. Isso diferencia em relação a plataformas puramente digitais.

Implicações para o mercado brasileiro

Algumas particularidades do Brasil merecem atenção:

  • O varejo físico ainda é muito forte, especialmente em cidades menores. A combinação online/offline é uma vantagem competitiva, mas exige infraestrutura de coleta e análise de dados em lojas físicas;
  • Questões de privacidade e regulamentações de proteção de dados (ex: LGPD) devem ser tratadas com atenção: exigem transparência sobre uso de dados, consentimento e governança da informação;
  • Penetração digital varia muito de região para região; vibrações culturais e comportamentais influenciam os formatos de anúncio mais aceitos;
  • A concorrência internacional (Amazon inclusive, marketplaces locais) tem sido forte, mas ainda há muitos varejistas de médio porte que podem explorar RMNs como diferencial competitivo;
  • A infraestrutura logística e tecnológica precisa acompanhar: sistemas de ERP, integração de canais, medição de resultados, capacidade de processamento de dados etc.

Não basta os varejistas terem apenas tráfego ou loja física: é preciso construir capacidades de mídia, cultivar dados de qualidade, adotar modelos de operação modernos, prover formatos atraentes às marcas, medir tudo com clareza, e pensar o negócio de publicidade como uma área de receita própria, não apenas acessória.
Há espaço para os varejistas se diferenciarem em nichos, em atuação regional, em formatos locais ou com excelência operacional. No Brasil, isso pode representar uma grande oportunidade ainda pouco explorada.